quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Orfão de Ferro

Texto extraído do excelente blog: http://blogdotitiobetao.blogspot.com.

Recomendadíssimo.


"Orfão de Ferro

Mil novecentos e noventa e oito ... em uma manhã de segunda-feira, acordo pra treinar, por volta das 5:00h da matina. Banana, aveia e muita disposição pra treinar, dia de ombros. Naquela época, o melhor pré-treino era a vontade de crescer ... nada de jack´s, shotgun´s ou c4´s .... a coisa era feita na raça mesmo.


Abro a porta de casa e a chuva já começa a castigar meu rosto. Sem guarda-chuva, pego um plástico grande, me cubro e vou andando pra academia .... 20 minutos contados no relógio a passos rápidos. No meio do caminho, carros passam apressados, expressões de preocupação. Sinto-me abençoado por estar indo treinar e não trabalhar.
Final de semana havia demorado demais pra passar, eu estava afoito por um treino.
Chegando na academia, uma moça na recepção, com um sorriso forçado, me recebe com um "bom dia" frio. Onde estaria o dono da academia que sempre falava ao me ver "Betão, quero ver você comer os ferros hoje, hein, e ainda são 6 da manhã". Ainda na recepção, uma placa de "Seja Benvindo", flores e uma catraca que não estava lá antes.

Entrei meio desnorteado, procurei minha gaiola de agachamento, pois era ali que eu faria o desenvolvimento de ombros, em pé ... mas não a achei ... no lugar dela havia uma máquina que eu nunca havia visto ... por dedução, achei que era uma máquina de tríceps. Mais tarde, alguém me falaria que era uma máquina de pullover ....

Olhei ao redor e vi os halteres maiores jogados em um canto, com algumas barras, todos empilhados, como se alguém fosse chegar com um caminhão e levá-los embora pra sempre.

Uma sensação de vazio tomou conta de mim ... Vinte minutos depois eu ainda não havia começado o treino. Fiquei ali, parado, vislumbrando dezenas de máquinas novas. Metade eu não sabia pra que servia. Vi pesos bola coloridos, anilhas de borracha novinhas, sem nenhuma ferrugem .... Aquele não era meu mundo. E veja bem, meu mundo não era sujo, imundo .... só não era fresco e colorido.

Fui embora sem treinar. Voltei 12 horas depois orando pra que tudo aquilo que eu havia visto tivesse sido um sonho, um pesadelo.

Ao chegar, na recepção, outra moça me dava "boa tarde" ... mas o sorriso falso era o mesmo. Onde estaria o dono da academia ? Aquele cara barbudo, forte e, por muitas vezes, enfezado ?????

Adentrei a sala de musculação. Estava lotada. Pessoas sorrindo, conversando, no celular, contando piada. Os halteres e pesos amontoados não estavam mais lá. Era um mar de pessoas coloridas. Onde estava minha academia ? O que aconteceu com ela ? Estava com cheiro de perfume barato, uma música chata e sem emoção tocando. Onde estava o rock que tocava antes ???
 
 
Então, me dei conta que aquele não era mais meu ambiente ... as pessoas que ali estavam não tinham nada a ver comigo. Eu queria treinar, transpirar, sentir dor, cansaço ... queria ficar exausto, olhar pro meu professor e ele murmurar "seu frouxo" ....

Uma televisão de LCD na Globo e as pessoas ao seu redor fechavam a visão do inferno. As pessoas não estavam treinando, estavam conversando, sentadas nos bancos de supino ou falando no celular.

Minha academia, meu segundo lar, sucumbiu a indústria fitness .... fiquei sabendo que meu professor havia vendido a academia e em apenas um final de semana, transformaram o templo dos ferros em uma academia igual a tantas por aí.

Fiquei orfão dos ferros .... o ano era 1998 .... e eu tinha que fazer alguma coisa ... "

Betão 
 
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Informações: http://blogdotitiobetao.blogspot.com/2012/10/orfao-de-ferro.html#comment-form

2 comentários:

  1. Fiquei lisonjeado ... muito obrigado pelo carinho!

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    1. Grande Betão! O agradecimento é todo nosso, pois temos aprendido muito com seu blog. Parabéns por seu trabalho, em fazer com que a musculação seja vista da maneira correta e sempre inspiradora.

      Abraços.

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